Nuno Cunha: entrevista com Nuno Vicente.
(Sábado/DN).

Para Nuno Vicente, a obra começa e acaba com o público presente, como um acto de partilha. Aspira à poética e à intemporalidade, e considera só poder atingi-la com temas universais, que a arte sempre abordou. O artista expõe desde ontem na Galeria Paulo Amaro, em Lisboa, e a mostra manter-se-á patente até dia 30 de Outubro.

Nuno Cunha: No desenvolvimento do seu trabalho quais são as suas preocupações e onde pesquisa?

Nuno Vicente: O meu trabalho não se resume facilmente a uma linha.

NC: Mas que questões trata?

NV: O que estive a tentar fazer com esta exposição tem que ver com uma tomada de consciência que se relaciona com a minha visão pessoal, de procura da essência de alguma coisa. Parto sempre de uma reflexão. Não há um pensamento que ligue a
obra toda, pelo menos de modo muito directo. Para cada trabalho há um pensamento. Eu concebo a obra muito mais no sentido de um contacto com o público.

NC: Qual é o tipo de questões especificas, suas, que se reflectem no seu trabalho?

NV: Numa perspectiva mais política do meu trabalho, ele não é direccionado para nenhum problema sociológico, mas centra-se sempre muito na essência, um problema que será antropológico. Logo aí se afasta de questões que apontam para algo determinado, ou relacionado com uma fracção da população. O meu tipo de preocupações relaciona-se talvez mais com a essência do humano.

NC: Em que sentido é que o seu trabalho se relaciona com questões que são do foro da antropologia?

NV: Por exemplo, o título desta exposição (Soluções Poéticas para Coisa Nenhuma) é ao mesmo tempo sincero e irónico, é simples e tem um pouco que ver com a minha postura: para falar, digamos, do amor, em vez de procurar dar uma grande volta, para as pessoas, depois, estarem com uma grande reflexão ou um grande sentimento até perceberem que é sobre o amor, coloco a coisa de modo directo através de pequenos jogos, para que seja facilmente assimilado, embora espere que provoque uma reflexão profunda. Clarificando, o conceito de arte conceptual é algo que me faz alguma confusão e eu não gosto de estar associado a ele, mesmo que hoje seja tido como algo nobre.

NC: E consegue identificar os elementos que na sua obra retratam essa visão?

NV: Hoje vemos uma panóplia de artistas que estão todos próximos uns dos outros. No que eu faço há sempre uma abordagem sensível, mesmo quando há sensibilidade e ironia, para que não caia no vazio ou seja apenas para a esfera da arte. É como se houvesse duas artes: uma intemporal e outra que é o próprio mundo da arte, que surge com a modernidade e se tem afunilado nestes últimos anos.

NC: Nesses dois mundos onde procura posicionar-se?

NV: Eu tenho sempre uma vontade de partilha com o público e recorro a ferramentas que adquiri. Tento ser contemporâneo neste ponto. Ao nível do conteúdo, tento que seja intemporal. Trato de assuntos que os artistas há quinhentos anos já tratavam,o que irá manter-se também no futuro.

NC: A poesia é importante no seu trabalho?

NV: A poesia é uma nobreza que eu gostava de alcançar.

NC: A forma como desenvolve o seu trabalho é intuitiva ou racional?

NV: É muito sincera.

NC: Certo, mas isso não responde à minha questão…

NV: Eu percebi a sua pergunta. O meu trabalho, mesmo quando é racional, tem sempre um fundo sensível.

NC: O público é importante na sua obra?

NV: É importante sempre. O que faço é pelo público. É mesmo um acto de partilha. A obra começa e acaba com o público.


Nuno Cunha / Nuno Vicente
2009